Justiça Federal suspende processo de renovação antecipada da Enel em SP até decisão sobre possível cassação do contrato
09/10/2025
(Foto: Reprodução) Aneel cobra Enel por demora em religar luz em São Paulo
A Justiça Federal em São Paulo suspendeu nesta quinta-feira (9) o processo de renovação antecipada do contrato de concessão da Enel, concessionária responsável pela distribuição de energia na capital paulista. A decisão é liminar e ainda cabe recurso.
A determinação foi dada pela 12ª Vara Cível Federal e atende um pedido da Prefeitura de São Paulo, que questiona falhas no fornecimento de energia e a falta de transparência no processo conduzido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Na prática, a Aneel e a União Federal estão impedidas de avançar com qualquer medida para prorrogar o contrato da distribuidora até que pendências regulatórias e processos de fiscalização em andamento sejam concluídos.
📝O contrato atual da Enel com a Prefeitura de São Paulo se encerra em 2028, mas a gestão municipal cobra uma reformulação nos critérios de avaliação da empresa antes que qualquer renovação seja considerada.
O juiz Maurílio Freitas Maia de Queiroz destacou na decisão que a antecipação da renovação “ignora a necessidade de se fiscalizar e apurar o implemento das medidas e sanções impostas” à empresa por falhas reiteradas no fornecimento de energia.
"Defiro parcialmente a tutela de urgência requerida pelo município de São Paulo para determinar a suspensão imediata do processo administrativo de prorrogação antecipada do contrato de concessão da Enel até decisão definitiva no processo que pode resultar na caducidade do contrato atual, bem como aferição do cumprimento satisfatório das medidas fiscalizatórias e sancionatórias impostas", diz trecho da senteça.
Segundo a decisão, a Enel foi multada em R$ 320 milhões em 2023 por problemas no restabelecimento de energia após temporais. A Aneel também abriu um processo que pode levar à caducidade (ou cassação) da concessão, mas que ainda não foi concluído.
Já a Prefeitura de São Paulo argumenta que o contrato não pode ser renovado antes que essas questões sejam resolvidas.
O magistrado lembrou que o fornecimento de energia elétrica é um serviço público essencial e que, portanto, deve ser prestado de forma contínua, eficiente e segura. A decisão cita ainda os impactos de eventos climáticos recentes, que deixaram milhares de pessoas sem luz na região metropolitana.
🖊️ A Enel Distribuição São Paulo detém uma concessão federal gerida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para distribuir energia elétrica em 24 municípios da região metropolitana, incluindo a capital, atualmente atendendo cerca de 8 milhões de pessoas (leia mais abaixo).
👉 A caducidade está diretamente relacionada ao processo de extinção de um contrato de concessão de serviço público, motivada por indícios ou comprovação de falhas graves por parte da concessionária.
Determinações à Aneel e à Enel
Na decisão, a Justiça determina que:
Aneel apresente documentos e esclarecimentos sobre o processo de fiscalização e eventual caducidade do contrato;
Aneel e União não avancem com nenhuma etapa de prorrogação até julgamento definitivo da ação;
A Enel SP adote medidas adicionais de contingência e compartilhe, em tempo real, informações operacionais com a prefeitura durante eventos climáticos extremos.
O juiz também rejeitou pedido de sigilo no processo e ressaltou que, por se tratar de serviço público, deve prevalecer o princípio da transparência.
Nos primeiros seis meses de 2025, Enel diz que 6 mil metros de fiação foram furtados
Divulgação
Em nota sobre a decisão, a Enel afirmou que "tem um compromisso de longo prazo com o país, traduzido por investimentos massivos em tecnologia, renovação de redes e contratação e formação de pessoal".
"A companhia explicita sua confiança nos ritos de renovação estabelecidos pelos agentes reguladores, que dão segurança aos investimentos presentes e futuros da empresa e reforça que cumpre rigorosamente todas as cláusulas estabelecidas em seu contrato de concessão.”
Pedido de renovação
O contrato de concessão da Enel foi firmado em 1998 e se encerra em 2028, mas pode ser renovado por mais 30 anos. A empresa já havia solicitado a prorrogação antecipada com base no Decreto Federal nº 12.068/2024, que estabelece novas diretrizes para distribuidoras de energia elétrica no país.
A Enel atende cerca de 8 milhões de unidades consumidoras em 24 municípios da região metropolitana de São Paulo. Desde 2023, a distribuidora tem sido alvo de críticas de consumidores, prefeitos e autoridades por blecautes prolongados e demora no atendimento após temporais.
Análise de infrações
Na terça-feira (7), o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, disse que o processo relativo às infrações cometidas pela Enel, concessionária responsável pela distribuição de energia na capital paulista, deve ser analisado antes do pedido de renovação antecipada da concessão feito pela distribuidora.
“O processo foi distribuído por conexão para a diretora Agnes, exatamente porque esses processos são interdependentes. Vamos imaginar, por absurdo, que esse processo de renovação andasse, a diretoria aprovasse", afirmou o diretor, em entrevista a jornalistas.
"Não vejo possibilidade de isso acontecer, porque existe aí um processo instrutório que precisaria ser deliberado antes”, completou ele, referindo-se ao processo que apura falhas da Enel na recomposição de energia após eventos climáticos.
Sandoval de Araújo Feitosa Neto, diretor da Aneel, durante reunião em comissão do Senado. em 2022
Roque de Sá/Agência Senado
Em setembro, a área técnica da Aneel apontou que a empresa atende a requisitos para renovação do contrato. À época, ao ser questionado por jornalistas, Feitosa disse que a nota é meramente "instrutória" e ainda será analisada pela diretoria colegiada da agência.
O documento foi elaborado por superintendentes e técnicos da agência. Pelo rito, a nota técnica será distribuída a um diretor, que deverá submeter parecer ao colegiado da diretoria. A palavra final será dada pelo Ministério de Minas e Energia.
O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo se manifestou dias depois à nota pela suspensão imediata do processo de renovação antecipada do contrato de concessão da Enel, concessionária responsável pela distribuição de energia na capital paulista (leia mais abaixo).
O contrato atual se encerra em 2028, mas a Prefeitura de São Paulo cobra uma reformulação nos critérios de avaliação da empresa antes que qualquer renovação seja considerada.
Suspensão
No final de setembro, o Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo se manifestou pela suspensão imediata do processo de renovação antecipada do contrato de concessão da Enel.
As considerações do órgão federal, por meio da Procuradoria da República, se mostram favoráveis à ação civil pública que a Prefeitura de São Paulo moveu contra a concessionária e a Aneel após recentes episódios de má prestação do serviço na cidade.
O serviço tem sido alvo frequente de críticas do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e, na semana passada, entrou também na mira do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que falou em "varrer a Enel de São Paulo".
Segundo o MPF, a Aneel não pode dar prosseguimento ao pedido de renovação enquanto tramita um processo administrativo que pode resultar na caducidade da concessão da empresa.
Esse procedimento foi aberto em outubro de 2024 após uma série de falhas no fornecimento de energia e multas que, de acordo com o município de São Paulo, somam mais de R$ 320 milhões.
Pelo menos desde 2023, milhares de paulistanos têm enfrentado frequentes interrupções no serviço e longos períodos de espera para o restabelecimento, sobretudo em épocas de fortes chuvas.
Funcionários da Enel
Enel/Reprodução
Ao mesmo tempo que conduz o processo pelo possível fim do contrato vigente, a Aneel tem dado andamento ao pedido da Enel de prorrogação antecipada, inclusive com a aprovação, em fevereiro deste ano, da versão preliminar do termo aditivo que estenderia o vínculo entre a empresa e o município.
O MPF destaca que a conduta fere o decreto federal que regulamenta as condições para a prorrogação e licitação das concessões de distribuição de energia elétrica, o qual determina expressamente a suspensão de recomendações para prorrogação de contratos caso haja processos administrativos de caducidade em tramitação.
Na manifestação, assinada pelo procurador da República Luiz Fernando Gaspar Costa, o MPF argumenta que o decreto federal é claro ao suspender qualquer prorrogação em caso de processo de caducidade em andamento.
Para o MPF, conceder a renovação antes da conclusão desse procedimento poderia gerar “embaraço” e prejudicar a apuração das responsabilidades da concessionária.
Em nota, a Enel disse que "cumpre todos os critérios estabelecidos no decreto para prorrogação antecipada das concessões de distribuição de energia no país" (leia nota na íntegra abaixo).
Críticas à qualidade do serviço
Na ação civil pública, a Prefeitura de São Paulo sustenta que houve uma degradação do serviço desde que a Enel assumiu o controle da Eletropaulo em 2018. O município cita o aumento de quedas de energia em períodos de chuva, redução de 51% no quadro de funcionários, corte de quase 50% nos custos operacionais e descumprimento de metas de investimentos.
A gestão municipal também afirma que a prática dos chamados “expurgos de dias críticos”, adotada pela Aneel, mascara a real qualidade do fornecimento. Esse mecanismo permite desconsiderar interrupções causadas por eventos climáticos extremos nos indicadores oficiais de continuidade do serviço.
Em novembro de 2023 e outubro de 2024, episódios de ventos superiores a 100 km/h resultaram em apagões prolongados. O número de imóveis atingidos foi três vezes maior que em eventos climáticos semelhantes de 2015, quando a empresa ainda não era controlada pela Enel.
Na semana passada, a primeira tempestade da primavera deixou mais de 500 mil imóveis sem luz na Grande São Paulo. Na ocasião, Nunes criticou a qualidade do serviço oferecido pela empresa.
Na mesma semana, durante evento para mitigar o efeito da chuva que atingiu o estado de São Paulo, Tarcísio fez coro com o prefeito da capital e falou em "varrer a Enel de São Paulo".
Ricardo Nunes leva ofício ao TCU para fiscalização dos serviços da Enel.
TV Globo/ Reprodução
Defesas no processo
Em manifestação no processo, a Enel nega desinvestimento e diz ter aplicado R$ 10,1 bilhões em São Paulo desde 2018. A empresa argumenta que os apagões de 2023 e 2024 foram provocados por ventos acima de 100 km/h, comparáveis a furacões, e que a responsabilidade pela poda de árvores — frequentemente citada como causa das quedas de energia — é do município, cabendo à companhia apenas o papel de apoio.
A concessionária também afirma que cumpre as metas oficiais da Aneel e que os expurgos são mecanismos legais previstos em normas federais.
A Aneel reconhece falhas na prestação do serviço, mas defende um processo de “aprimoramento gradual” para evitar insegurança regulatória. A agência afirma que a decisão de prorrogar segue critérios técnicos previstos em decreto federal.
Já a União, como poder concedente, alegou que não houve até agora ato concreto de renovação e que a ação judicial é prematura. O pedido agora será analisado pela 12ª Vara Cível Federal de São Paulo.
Contrato
O contrato de concessão da Enel vence em 2028, mas em março deste ano a Enel e outras distribuidoras pediram à Aneel a prorrogação das concessões por 30 anos.
Isso abriu espaço para que a Enel e outras distribuidoras renovassem antecipadamente seus contratos que venceriam entre 2025 e 2031.